Suspeita de irregularidade com verba do Esporte tem cargo no DF

Convênio foi firmado quando Agnelo Queiroz era ministro, em 2005.CGU apontou vários indícios de irregularidades; servidora não se manifestou.

Jamila TavaresDo G1 DF
A administradora do Riacho Fundo II, Geralda Godinho Sales, nomeada para o cargo pelo governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, presidiu uma entidade que recebeu R$ 1,82 milhão de um convênio do programa Segundo Tempo, do Ministério do Esporte em 2005, ano em que Agnelo comandava a pasta.


Relatório da Controladoria Geral da União (CGU) aponta irregularidades no convênio assinado com a Federação dos Trabalhadores do Comércio do Distrito Federal (Fetracom), como falta de prestação de contas, pagamento adiantado a fornecedores por serviços não realizados e suspeita de fraude em licitações.

O convênio previa o repasse de R$ 1,82 milhão pelo Ministério do Esporte à entidade, que deveria dar em contrapartida R$ 267 mil, totalizando R$ 2.087.000 milhões para o atendimento do contrato.


A reportagem do G1 entrou em contato com Geralda na quarta-feira (19) e nesta quinta-feira (20) e até a publicação desta matéria.

Em nota, a Fetracom informou que “cumpriu integralmente todas as exigências expressas no convênio firmado com o Ministério do Esporte” e que “as acusações envolvendo a ex-presidente da Fetracom e atual administradora do Riacho Fundo II não encontram respaldo na realidade e não passam de acusações levianas.”

Por meio de notas e em declarações na Suíça, onde está em viagem oficial, Agnelo já negou irregularidades durante sua gestão no ministério (veja vídeo acima). A assessoria do Ministério do Esporte foi procurada e disse que fez uma verificação das contas do convênio em 2009 e encaminhou um novo relatório para a CGU.

De acordo com a assessoria da CGU, a Fetracom firmou dois convênios com o Ministério do Esporte, ambos pelo programa Segundo Tempo. O segundo convênio também está sendo analisado pelo órgão, que não deu detalhes sobre o contrato.


O convênio de 2005 analisado pela CGU tinha como objetivo implantar sete Núcleos de Esporte Educacional do Programa Segundo Tempo no DF. De acordo com o plano de trabalho apresentado pela federação, as unidades deveriam atender 5 mil alunos da rede pública de ensino.

O relatório da CGU, datado de 2009, aponta que há indícios de que a Fetracom contratou monitores para o projeto sem a capacitação exigida, serviu merenda diferente da estabelecida no convênio e não prestou atendimento odontológico aos estudantes, como previsto em contrato.

A controladoria também aponta que o número de crianças que participaram do projeto foi muito inferior ao estabelecido no plano de trabalho. Das 5 mil crianças que deveria ser atendidas, a CGU verificou que 1.187 acompanharam o programa – 24% do total previsto.

O relatório diz ainda que a federação teria contratado a empresa do marido de Geralda e de uma irmã dela para prestar o serviço de transporte dos estudantes . A empresa teria sido a única a apresentar proposta.
A controladoria aponta que a empresa tinha oito funcionários em 2006 e 15 em 2007, número que seria insuficiente para dirigir os 50 veículos estabelecidos em contrato. “Além disso, os documentos pertinentes à execução do convênio não trazem elementos que comprovem eventual locação de veículos pela fornecedora do transporte ou a contratação de terceiros para prestação de serviços”, diz a CGU.
Rosquinhas em vez de refeições

A empresa que venceu a licitação para fornecer alimentação aos participantes do projeto também pertencia a uma irmã de Geralda, diz o relatório. Segundo a CGU, a empresa recebeu parte do dinheiro antes mesmo de prestar os serviços.

O cardápio apresentado pela Fetracom no plano de trabalho previa que os estudantes receberiam refeições balanceadas na merenda, como macarrão com carne, fruta e suco ou sopa de carne com legumes e pão.
O relatório da CGU aponta que esse cardápio foi substituído por um com menor valor nutricional. “O reforço alimentar estava sendo atendido mediante o fornecimento de lanches compostos de bolos, roscas de queijo, sanduíches, biscoitos e sucos de frutas”, diz o texto.
Além disso, a CGU destaca que a empresa que venceu a licitação possuía apenas cinco funcionários nos anos de 2006 e 2007, pessoal que seria insuficiente para preparar a merenda das 5 mil crianças que o projeto buscava atender.
“Em uma análise bastante simplista, é possível compreender que para a preparação e distribuição dos alimentos às 5 mil crianças atendidas pelo convênio, em núcleos distantes entre si, haveria necessidade de um quantitativo maior de pessoal para o fornecimento da alimentação nos termos propostos pelo plano de trabalho”, diz o texto da CGU.
Falta de controle

O relatório aponta que a impropriedade contábil efetuada pela Fetracom seria de “fácil detecção e que o Ministério do Esporte não analisou suficientemente a documentação apresentada pelo proponente, fato que resultou na formalização de convênio com entidade que não apresentava condições financeiras de arcar com a contrapartida assumida.”

Em nota, a assessoria do GDF informou que “nada consta no Tribunal de Contas da União ou na Controladoria Geral da União (CGU) condenando qualquer ato de Agnelo Queiroz. Ele não aparece sendo responsável por nenhuma dessas situações citadas. O próprio Ministério do Esporte tomou medidas de apuração em relação a convênios em geral que apresentaram indícios de irregularidades.”
Agnelo está em viagem oficial a Zurique, na Suíça, onde participou nesta quinta-feira do anúncio das cidades que sediarão jogos da Copa das Confederações e as que vão abrir e fechar a Copa do Mundo de 2014.
O relatório foi enviado ao Tribunal de Contas da União em 2009 e analisado em duas sessões. O processo correu em sigilo. A assessoria da CGU informou que uma Tomada de Contas Especial foi instaurada em novembro de 2009 no próprio ministério.
Inquérito no STJ

Agnelo é um dos investigados em inquérito que tramita no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para apurar suposto desvio de verbas no Ministério do Esporte no período em qe foi ministro, entre janeiro de 2003 e março de 2006.

O processo tramitava na 12ª Vara da Justiça Federal e só foi para o tribunal por conta do foro de Agnelo - pela lei, governadores só podem ser investigados ou processados no STJ. O inquérito, de número 761, chegou ao gabinete do ministro Cesar Asfor Rocha, do STJ, na última terça (11).
Em nota divulgada às 23h42 desta quinta, a assessoria do GDF informou em nota que "apenas a existência de um inquérito por si só não atinge a conduta de Agnelo Queiroz quando foi ministro do Esporte e muito menos agora, na condição de governador do Distrito Federal."
A nota também diz que "o inquérito [do STJ] não traz assunto novo. Ele foi originado de denúncias realizadas na campanha eleitoral de 2010, cujos autores foram processados e desacreditados por outros depoimentos. Além disso, o relatório final do Ministério Público Federal sobre o caso não incluiu o nome de Agnelo Queiroz entre os denunciados."
O motivo pelo qual Agnelo aparece no inquérito é um depoimento à Polícia Federal de uma testemunha, Geraldo Nascimento Andrade, que afirmou ter presenciado a entrega ao ex-ministro, por um integrante do suposto esquema, de R$ 256 mil em dinheiro.
Na época, Agnelo já havia deixado o Ministério do Esporte. O atual governador sempre negou a acusação, que chegou a ser explorada por adversários na campanha eleitoral do ano passado. A denúncia havia sido divulgada do ano passado pela revista "Época".

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