Emendas Parlamentares: As emendas dos distritais festeiros

Dos R$ 348 milhões que os parlamentares incluíram no orçamento de 2014, R$ 50 milhões serão para promover eventos na área cultural. Nos últimos anos, gastos milionários com a realização de shows viraram o centro de denúncias de corrupção.

Plenário da Câmara Legislativa: o orçamento do GDF para 2014 foi aprovado na última sessão do ano, realizada na última quinta-feira (Janine Moraes/CB/D.A Press)Um deputado distrital — Raad Massouh (PPL)— foi cassado por conta de suspeita de desvios de recursos públicos de uma emenda para evento cultural em Sobradinho, a Secretaria de Transparência, o Ministério Público e a Polícia Civil do Distrito Federal abriram várias investigações sobre irregularidades na aplicação de recursos para shows. Mesmo assim, eventos religiosos, católicos ou evangélicos, paradas gays, festas juninas e shows em comemoração aos aniversários das cidades do Distrito Federal são prioridade para os distritais. Entre os R$ 348 milhões que os parlamentares incluíram no Orçamento de 2014, R$ 50 milhões foram destinados à área de cultura, mas a maioria desses recursos é reservada para shows e festas. O Correio analisou todas as 667 emendas apresentadas este ano pelos integrantes da Câmara Legislativa para fazer um ranking dos deputados mais festeiros da Casa. Cada um tem direito a destinar R$ 14,5 milhões a projetos na área em que preferir. ...

Para os órgãos de controle, há uma preocupação com a aplicação de recursos em emendas para shows porque a fiscalização é mais difícil. Os cachês de artistas são pagos sem licitação, com valores definidos, muitas vezes, sem uma planilha de custos, e não há como atestar, depois de realizada a festa, as despesas pagas com recursos públicos. Nos últimos anos, emendas para shows viraram foco de denúncias de corrupção.

Um dos episódios, revelado pelo Correio em junho, foi o gasto milionário na festa de aniversário de Itapoã. A cidade carente de infraestrutura teve um evento ao custo de R$ 1 milhão, com cachê de R$ 400 mil para a apresentação de Amado Batista. O cantor cobra, em média, R$ 150 mil para subir ao palco. O evento ocorreu graças a uma emenda do deputado Aylton Gomes (PR). O episódio resultou na demissão do então administrador da cidade, Donizete dos Santos, indicado pelo PR.

Em agosto, por decisão judicial, o administrador de Santa Maria, Néviton Pereira Júnior, uma aposta do PMDB para a Câmara dos Deputados, também foi afastado após indícios de desvio de verbas para a contratação de artistas na 23ª edição do Aniversário de Santa Maria (Fassanta 2013). A emenda para a realização do evento também era de Aylton Gomes.

Cláudio Abrantes (PT), Rôney Nemer (PMDB) e Aylton Gomes encabeçam o ranking de emendas para festividades. O petista separou R$ 6,5 milhões do montante para o setor. Como o distrital tem base eleitoral forte em Planaltina, a maioria dos recursos foi reservada para eventos e shows na cidade. Conhecido até hoje por interpretar durante uma década o papel de Jesus Cristo na Via-Sacra do Morro da Capelinha, Abrantes destinou R$ 300 mil para a tradicional encenação, além de garantir recursos a fim de viabilizar outros eventos de Planaltina. Os deputados também inserem emendas para eventos em áreas como esportes e até agricultura. Abrantes, por exemplo, separou mais R$ 500 mil para outras rubricas da área vinculadas ao Orçamento.

Aylton Gomes, que no ano passado apareceu como campeão de emendas para shows, continua entre os mais festeiros. Ele reservou R$ 6,4 milhões para o setor cultural e, se depender do distrital, mais R$ 350 mil serão para apoiar eventos de outras áreas. Assim como outros colegas que estão de olho nos votos religiosos, Aylton demonstrou preferência por eventos como a Via-sacra, a Festa de Pentecostes, Hallel, Círio de Nazaré, Cruzada Evangelística e Corpus Christi.

Já Rôney Nemer reservou 
R$ 5,1 milhões para cultura. Ele decidiu aplicar recursos em eventos como a Festa do Morango, Festflor, vias-sacras, evento da medalha milagrosa, caldeirão cultural do Varjão, festas de padroeiros de diferentes cidades do DF, carnaval, Hallel, Festa da Ermida e micareta católica. Além do montante, Rôney destinou R$ 810 mil para bailes de sociedades esportivas e torneios. 

Com a destinação de R$ 3,7 milhões para cultura, a líder do Governo na Câmara Legislativa, Arlete Sampaio (PT), aparece entre os cinco primeiros com mais recursos voltados para o setor. Mas, ao contrário dos colegas, a parlamentar não focou em eventos. Ela reservou dinheiro para a Orquestra Sinfônica, a reforma de prédios do patrimônio histórico, construção de espaços culturais e para o Fundo de Amparo à Cultura. Já o presidente da Casa, Wasny de Roure, também petista, reservou R$ 4 milhões para o setor cultural.

Bases

A análise das emendas também revela privilégios para as bases dos distritais. Enquanto deputados como Rôney Nemer e Washington Mesquita (PTB) destinaram verba elevada para eventos católicos, Evandro Garla (PRB), que é da Igreja Universal, reservou um montante significativo aos evangélicos. Ele previu um gasto de R$ 1,5 milhão para festas como o Dia do Evangélico, montagem do palco gospel do aniversário de Brasília e a Marcha para Jesus.

Além dos recursos para shows, os parlamentares deram atenção especial a áreas consideradas estratégicas para cada um. Patrício, que é policial militar de carreira, direcionou R$ 3 milhões em emendas para a segurança pública, com destaque para a reforma de quartéis e apoio às atividades da pasta responsável pelo setor. 

Delegado aposentado da Polícia Civil, Dr. Michel (PP), que se elegeu com votos de Sobradinho II, também garantiu benefícios para a segurança pública, principalmente para a corporação a qual pertence. Ele também deu atenção à sua base eleitoral regional, prevendo recursos para obras e urbanização de Sobradinho II. 

Há casos de deputados que precisam se dividir para agradar à própria base e também à de aliados. A distrital Luzia de Paula (PEN) é suplente do correligionário Alírio Neto. Ela destinou recursos de emendas para Ceilândia, sua base eleitoral, e também para o Guará, onde o titular do mandato reúne boa parte de seus votos.

O que foi reservado

Os três que mais destinaram dinheiro para festas e eventos:

Cláudio Abrantes 
O ex-Cristo da Via Sacra apresentou R$ 6.510.000 para cultura 
e reservou R$ 500 mil a eventos em outras áreas

Aylton Gomes 
Destinou R$ 6.450.000 à área de cultura e R$ 350 mil a apoio 
de outros eventos. Emendas dele derrubaram dois administradores

Rôney Nemer 
Reservou R$ 5.180.000 para a área de cultura 
e R$ 810 mil para apoiar eventos de outras áreas

(*) Os recursos destinados à cultura são os específicos dessa rubrica, enquanto os de apoio a eventos vão para festividades de outras áreas.

As emendas dos distritais festeiros

De fácil execução
Os deputados festeiros alegam que destinam grande volume de recursos para eventos com o objetivo de atender demandas que chegam aos gabinetes. Os parlamentares também privilegiam a área cultural com a desculpa de que esse setor é privilegiado na hora da execução das emendas. Esses recursos podem ser gastos com mais facilidade porque a maioria dos shows é contratada com dispensa de licitação pública. 

O deputado Cláudio Abrantes confirmou que dá atenção à área de cultura e alega que recebe muitos pedidos para ajudar a viabilizar a realização de eventos. “Sou de Planaltina, uma cidade com festas muito tradicionais, como a do Divino Espírito Santo e a Via-Sacra. Acho justo contribuir com essas manifestações culturais e religiosas”, explicou. A assessoria de imprensa de Aylton Gomes informou que o parlamentar busca atender as demandas que chegam ao gabinete. Rôney Nemer preferiu não se manifestar sobre o assunto.

Arlete Sampaio conta que, no início deste mandato, ela privilegiava emendas para áreas como saúde e educação. Mas nenhuma delas foi executada pelo governo. “Não adianta fazermos emendas para essas áreas porque não há execução. Além disso, a Secretaria de Cultura tem um orçamento muito pequeno e, por isso, conta com nossas emendas para conseguir viabilizar projetos importantes. O Festival de Ópera, por exemplo, recebeu recursos de minhas emendas”, explica. 

 Comparativo

De janeiro até o início de dezembro, o GDF pagou R$ 77,2 milhões em emendas. Desse total, R$ 35,3 milhões foram para a cultura. A bolada é maior até mesmo do que os gastos com obras. Na área de educação, o valor que acabou executado foi zero. Transporte e saneamento também não receberam nenhum centavo.

Fonte: Helena Mader-Almino Marcos-Correio Braziliense - 15/12/2013


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