Copa 2014: As feridas do Mané

Recém-inaugurado, o Estádio Nacional sofre com infiltrações, acidentes e vandalismo


Tido como uma das joias mais belas — e caras — do mundo esportivo, o Estádio Nacional Mané Garrincha tem sete meses de vida, mas já apresenta defeitos que ofuscam o brilho do monumento de 1,4 bilhão de reais. Depois de receber da Federação Internacional de Futebol (Fifa) a etiqueta de “magnífica”, a arena exibe trinta banheiros com infiltração no piso, além de ralos, acessórios de acabamento, tomadas e portas metálicas depredados. Uma vidraça espessa que serve de parapeito na área da arquibancada reservada para deficientes físicos apareceu estilhaçada. Outras peças espelhadas começam a despencar do alto da fachada externa. Alvo de críticas do Comitê Organizador da Copa e do técnico da seleção brasileira, Luiz Felipe Scolari, o gramado ainda não está no padrão exigido pela Fifa para receber uma partida da Copa do Mundo. ...


O problema que mais compromete a beleza do estádio encontra-se no piso. Protuberâncias de até 3 centímetros — algumas delas vertendo água — aparecem no revestimento de quase toda a área por onde circula o público. Segundo a avaliação de Dickran Berberian, engenheiro civil da Universidade de Brasília, esse tipo de avaria ocorre geralmente em obras complexas, tocadas em prazos curtos. Numa empreitada como essa, por causa da pressa, o revestimento de polímero é aplicado no chão antes da secagem total do cimento. “Deve-se esperar 28 dias. Se esse tempo não for respeitado, a água do concreto evapora, forçando o revestimento sintético e provocando essas saliências”, explica o engenheiro ao analisar uma foto do piso do Mané Garrincha. Berberian deixa claro que isso não afeta a estrutura nem a segurança do prédio.

A ação de vândalos também colabora para o desgaste da arena, que deixou a jogadora Marta, da seleção brasileira feminina de futebol, emocionada — ela não conteve as lágrimas ao pisar lá pela primeira vez. No show da banda Aerosmith, em outubro, com um público de 28 000 pessoas, foram destruídas as portas de enrolar dos bares e diversos acessórios de banheiro. Até agora não houve reposição desse material. Duas vidraças também foram quebradas na ocasião. Segundo o assessor técnico da Secretaria Extraordinária da Copa, Ricardo Bittencourt, as depredações feitas pelo público ocorrem principalmente na área por onde circulam as pessoas que pagam ingressos mais baratos. “Toda construção, após sua conclusão, necessita de ajustes pontuais, ainda mais obras complexas e grandiosas”, ressaltou a Coordenadoria de Comunicação para a Copa em nota oficial.

Nem toda avaria encontrada no Mané Garrincha tem origem na ação de baderneiros. É o caso das 21 vidraças espelhadas da área externa que foram quebradas e estão sendo substituídas. Segundo o secretário extraordinário da Copa, Cláudio Monteiro, os danos foram causados acidentalmente pelo guindaste usado para a instalação e a limpeza das peças. O fato estranho é que esses objetos danificados estavam distantes uns dos outros. Funcionários do local contaram outra história. Os espelhos teriam despencado um a um por terem sido aplicados fora do padrão. Monteiro nega.

Já o gramado é um capítulo à parte. A primeira atração musical no estádio, o show Renato Russo Sinfônico, atraiu 45 000 pessoas em junho. Na ocasião, metade do público se acomodou no gramado sem que ele recebesse nenhum tipo de proteção. Desde esse evento, o tapete verde nunca alcançou as condições exigidas para abrigar um jogo do Mundial de futebol.

Ao avaliar doze capitais brasileiras que sediarão a Copa do Mundo, o Instituto Ethos apontou Brasília como detentora do maior índice de transparência nos investimentos. Contudo, essa qualidade reconhecida não foi aplicada pelos três assessores do Governo do Distrito Federal em uma visita de VEJA BRASÍLIA ao estádio. Na terça (10), eles levaram a equipe de reportagem apenas à ala da arena onde não havia problemas aparentes. Foi preciso retornar ao estádio em outro momento para atestar uma série de avarias (veja detalhes no quadro abaixo). “Queria deixar claro que o Mané Garrincha está inaugurado, mas ainda não foi entregue pelo consórcio que o construiu. Isso só ocorrerá em março, quando a obra estará totalmente acabada e sem nenhum defeito”, explica Monteiro. Após essa entrega, o estádio, que foi apontado pelo secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, como uma das arenas mais bonitas do mundo, será de inteira responsabilidade do GDF. Mas caberá à população fiscalizar e zelar pela saúde do nosso gigante.


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